Tarde de sábado. O clima esquentou um pouquinho, um solzinho morno despontou por entre as nuvens cinzas do inverno, e Fud e Ido, aqueles dois ex funcionários da Bundabras, empresa privatizada por FHC, estão no mesmo bar de sempre, que tem cadeiras na calçada. Fud chama o garçon:
- Manda uma Xereca Pilsen estupidamente gelada e uma porção de bolinhos de bacalhau.
Ido olha desconfiado:
- Tem dinheiro, hoje?
- Fica frio. Minha mulher está fazendo as unhas da vizinhança, lá em casa, e me emprestou algum.
- Hmmm...sei. Vai indo bem?
- O foda é aguentar a mulherada cacarejando. Mas a coisa está indo bem sim. Já estamos até reformando a garagem pra montar um salão, o "Palácio da Beleza".
A paineira que cobre a calçada solta suas folhas, que vão caindo languidamente, desenhando sorrisos no ar. Ido coloca um bolinho de bacalhau inteiro na boca. Fud resmunga:
- Cara, assim essa merda vai acabar logo.
Ido faz que não ouve:
- Mas, Fud, o que você fez com aquela grana mixaria do plano de demissão voluntária da Bundabras?
- Você não lembra? Abri um bar.
- Puta ideia de jerico, porra. Justo você, que bebe pra cacete?
- Pois é. Fui à falência. Vendia uma e bebia três.
- Hehe.
- Você ri do que? E você, o que fez?
- Ué, prestei concurso para a Cubras.
- Passou?
- Não.
Um pardal saltita entre as mesas, recolhendo as migalhas de pão deixadas pela tristeza da tarde fresca.
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